Muralha nascente do Castelo de Abrantes
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Até onde a vista atinge, foi sempre assim a quem permaneceu no interior das muralhas do Castelo de Abrantes. Os primeiros povoadores certamente aí se estabeleceram edificando o primeiro núcleo urbano, por ser este o local onde melhor se avistava quem vinha por bem ou por mal. Com o passar dos anos tornou-se imprescindível na reconquista da linha do Tejo. A sua Torre de Homenagem, erguida entre os anos de 1300 a 1303, foi a " cereja " após a conclusão das obras de reconsolidação das muralhas. Do seu topo a vista alcança numa rotação de 360° panoramas aos quais não conseguimos ficar indiferentes, Belver, mais próximo, Santarém, mais longe, são dois exemplos do que se consegue observar a olho nu. Foi nas conquistas e reconquistas um sítio onde a ferocidade, a crueldade e desumanidade ultrapassaram limites. Do seu fosso defensivo, lugar onde muitas vidas terminaram, nasceu um Jardim, quem diria, uma prova de respeito e admiração por aqueles que deram as suas vidas por um objectivo, Abrantes.
Gatos de Abrantes, dos telhados, que se atrevem nos beirais, nos saltos, pulando de telhado em telhado. Espreitam quem passa, na rua, em baixo. Altabaixo exploram lugares inatingíveis, partes de Abrantes.
Abrantes, acorda quase sempre debaixo de um manto de névoa, a sua proximidade com o rio oferece nos meses mais frios a cobertura. Os abrantinos saem de casa revestidos dos pés à cabeça, caminham nas ruas empedradas, as quais parecem soltar água, ter atenção é necessário para avançar nos seus destinos. As primeiras saudações entre uns e outros são muitas vezes imperceptíveis, pelo tremelicar da voz enleada no frio, ou cachecol resguardando o rosto, abafando as palavras simpáticas. O trabalho espera por muitos deles, outros o ócio é vitalício, os cafés recebem clientes apressados para o primeiro café do dia. Bebido apressadamente, com tempo, para ouvir e dar novidades, ler o jornal, ter companhia quando em casa não se tem ninguém. Gosto deste quotidiano, muito idêntico todos os dias da semana, conjunto de hábitos que muitos abrantinos mantêm, ocupam os largos e as praças da cidade, conversas realizadas cautelosamente, protegendo as mãos nos bolsos, batendo os pés no chão, tentando assim protegerem-se do frio. Mulheres com andar bamboleante seguram sacos cheios, aproximam-se vindas da rua do mercado, as pontas das hortaliças espreitam, estão exuberantes, não há nada como a vaidade dos legumes e hortaliças com a aproximação da consoada. O comércio que resta no núcleo antigo, agradece estes passeantes, quem consegue, entra e sai de loja em loja, comprando aqui e ali, algo para mimosear um parente um amigo, lembrar que apesar da preocupação do momento há tempo para a família e os amigos. Abrantes está pouco quente neste período matinal, mais logo com a chegada da escuridão as iluminações de Natal trazem ânimo e alegria às ruas. Aquecem as pessoas que sacodem os problemas e continuam nas suas existências, sem perderem as capacidades de se realizarem.
A manhã em Abrantes, ainda não tinha acordado completamente, a vista para o rio com as margens engalanadas naturalmente pela folhagem das árvores, que a pouco e pouco se despedem dum outono chuvoso, surpreende quem caminha na direcção do curso de água. A aurora não necessita de promoção, a sua ascensão nunca é igual, nós é que teremos ser diferentes no sentido que ela continue sempre a nos desconcertar com os primeiros indícios de um novo dia.
A quinta foi acolhida na margem do rio Tejo como se sempre ali tivesse existido, valorizando o entendimento do homem com o rio. Situada na margem sul, na União de Freguesias do Rossio ao Sul do Tejo e S. Miguel do Rio Torto. De Interesse Municipal é dos mais antigos morgadios abrantinos. Actualmente é propriedade dos herdeiros do arquitecto Duarte Castel - Branco.
O nevoeiro intrometeu-se na manhã de Abrantes. Ofuscando as panorâmicas que se conseguem alcançar do alto do outeiro, mesmo assim, caminhar por Abrantes, nas ruas onde a presença humana é escassa, é fascinante. O silêncio, só interrompido pelo som das solas das botas, batendo no empedrado, pelo piar dos melros, que não se deixam observar, escondidos no meio da ramagem e das folhas mais resistentes das árvores dos jardins. A tranquilidade transmite a quem anda, como eu, deambulando por ruas que nunca se cansam receber-me, e a tantos outros, forasteiros, transeuntes, harmonia e atenção ao que nos rodeia. Pormenores que sempre ali estiveram, numa casa, numa rua, por magia surgem defronte dos meus olhos pela primeira vez. São estes momentos deslindando e perdurando o que me rodeia numa cidade de idade avançada mas sempre bonita.
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